Marisa busca renegociação para evitar recuperação judicial, dizem especialistas
Empresa anunciou a saída do CEO e a contratação de consultoria para reestruturação de suas dívidas, que chegam a 3,3 vezes sua geração de caixa
Lojas MarisaA empresa informou no balanço do terceiro trimestre ter dívida líquida de R$ 218,9 milhões, o que equivale a um 'índice de alavancagem financeira' de 22%(Divulgação/Marisa/Vitor Reis Primo)
Bloomberg Línea — O anúncio da varejista Marisa (AMAR3) de que trabalha em uma reestruturação das suas dívidas faz parte de uma tentativa de renegociação com credores para que a empresa evite uma recuperação judicial, de acordo com especialistas do mercado ouvidos pela Bloomberg Línea.
Em comunicado ao mercado divulgado na noite de terça-feira (7), a empresa disse que o movimento faz parte de um “processo de otimização financeira e aprimoramento de sua estrutura de capital”. Foram contratadas as consultorias BR Partners, para trabalhar na reestruturação das dívidas, e Galeazzi Associados, para cuidar do “aperfeiçoamento da estrutura de custos”.
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A empresa também informou que o diretor-presidente, Adalberto Pereira Santos, e o executivo Marcelo Adriano Casarin, membro do conselho de istração, deixaram a empresa.
Para o advogado Renato Scardoa, especialista em recuperação de empresas, as medidas anunciadas pela Marisa são comumente adotadas por empresas que buscam formas de negociar dívidas antes de ir ao Judiciário.
“Primeiro tentam renegociar por meio da diretoria com o setor financeiro. Não tendo êxito, contratam consultorias para reestruturar e, se não der certo, partem para a recuperação judicial e para medidas judiciais”, diz.
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Segundo ele, é provável que a recuperação judicial da Americanas - bem como o rombo de R$ 20 bilhões no balanço da companhia - tenha dificultado o o a crédito das varejistas de forma geral, setor dependente de dívidas com vencimento de curto prazo.
“Existe um rito a ser seguido”, diz o advogado. “Se depois de reestruturar a dívida a negociação com os credores não der certo, é provável que ela vá em busca da via judicial.”
Para Mirela Rappaport, sócia-fundadora da gestora InvestPort, a empresa está “se antecipando para entrar numa renegociação espontânea para evitar a recuperação judicial”.
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Sem surpresa
Rappaport, no entanto, afirma que, ao contrário do caso da Americanas, que pegou todos de surpresa, “todo mundo já sabia” que a situação da Marisa era “preocupante”. “A empresa tem uma situação de endividamento maior do que a média do setor”, diz ela.
A analista diz ainda que a manutenção dos juros altos pelo Copom, de 13,75% ao ano, também contribui para o agravamento da situação da empresa. “No varejo, quando os juros sobem, o endividamento sobe, porque é indexado ao CDI. E além disso, a alta dos juros segura o consumo, reduzindo a entrada de dinheiro nas empresas.”
Segundo relatório da InvestPort divulgado em 11 de janeiro, a Marisa foi a única empresa do setor que registrou queda na receita entre o segundo e o terceiro trimestre de 2022. A queda foi de 0,8% no período, depois de alta de 4,7% do primeiro para o segundo trimestre. A comparação é feita com Arezzo (ARZZ3), Soma (SOMA3), Restoque e Renner (LREN3).
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Outro agravante, segundo Rappaport, é que as empresas do setor varejista no Brasil se tornaram financeiras, com a emissão de cartões de crédito. No caso da Marisa, isso se transformou em “dupla exposição”, afirma.
“De um lado, a empresa viu seu endividamento aumentar - e, com a alta da taxa de juros, já vemos bancos aumentando o provisionamento para lidar com a alta da inadimplência, enrijecendo o controle da dívida - e também vê a inadimplência de seus clientes no cartão aumentar”, afirma.
Segundo o relatório da InvestPort, o índice de inadimplência da Marisa ficou em 29% de sua carteira de crédito no terceiro trimestre de 2022. Foi o nível mais elevado do setor.
No balanço do terceiro trimestre do ano ado, a empresa informou dívida líquida de R$ 218,9 milhões, o que equivale a um “índice de alavancagem financeira” de 22%.
Segundo a InvestPort, a empresa registrou dívida líquida de 3,3 vezes o seu Ebitda. “É a única com endividamento mais preocupante no curto prazo”, diz o relatório.
Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.