Bloomberg Línea — As incertezas e os ruídos advindos do governo de Donald Trump neste ano têm causado um clima de apreensão relacionado à maior economia do mundo e ampliado o interesse de investidores por ativos globais fora dos Estados Unidos.
Grandes gestoras já enxergam um “renascimento” do mercado europeu, enquanto players de Wall Street voltam a olhar para mercados emergentes.
Ainda assim, o investimento nos EUA segue como o mais atrativo entre todos os mercados do mundo na avaliação de dois gestores de portfólio do BTG Pactual (BPAC11): Marcelo Santucci, co-head e CIO de portfolio solutions global, e Rafael Mazzer, sócio e head de porfolio solutions Brasil.
“Reconhecemos a importância da diversificação, mas os Estados Unidos ainda são [a aposta] dominante”, afirmou Santucci em entrevista à Bloomberg Línea. “Seguem com um ambiente econômico mais versátil, seguro, com crescimento maior e com mais inovação.”
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A área de portfolio solutions é uma divisão voltada para a gestão personalizada de portfólios dos clientes, que se conecta a diversas outras áreas do banco, como wealth management e a asset proprietária, a BTG Pactual Asset.
São R$ 150 bilhões sob gestão, com especialistas em escritórios no Brasil, na América Latina, nos Estados Unidos e na Europa.
Apesar da preferência pelos EUA, os executivos avaliam e reconhecem que o ambiente atual é mais desafiador para os ativos do país.
“Foi muito confortável estar sobrealocado em dólar e bolsa americana na última década. Houve uma ‘chacoalhada’ que acordou o mercado para o tema da diversificação”, disse Mazzer.

Boa parte da turbulência recente nos EUA vem do comportamento considerado imprevisível do presidente americano Donald Trump, que tem usado tarifas como ferramenta de negociação com outros países, o que alimenta incertezas sobre a escalada da guerra comercial.
E, para além das tarifas, o governo americano tem enfrentado um desafio fiscal antes típico de países emergentes: trajetória ascendente da dívida pública em um cenário de juros ainda altos, o que amplia riscos e temores sobre a sua sustentabilidade.
A Moody’s foi a última das três grandes agências de classificação de risco a rebaixar a nota de crédito dos EUA, em maio deste ano, evidenciando as preocupações com as finanças do país.
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Nessa frente, Trump entra novamente como ponto de preocupação.
O republicano apresentou seu “One Big Beautiful Bill”, um projeto de lei tributário que acrescentaria US$ 2,4 trilhões ao déficit orçamentário dos EUA na próxima década, de acordo com uma estimativa recém-divulgada pelo Congressional Budget Office, instituição apartidária ligada ao Congresso.
A medida pode aumentar o rendimento dos Treasuries, com pressão sobre a taxa de juros em toda a economia e elevando a dívida do próprio governo, o que amplia ainda mais os riscos na visão do mercado.
“Não acreditamos que haverá default. Por isso ainda temos mais disposição [de investir] nos Estados Unidos que nas demais regiões”, afirmou Santucci.
“Mas ainda estamos mais centrado na parte intermediária da curva de juros americana, pois esse nível de juros mais altos do que a média proporciona oportunidades na renda fixa.”
Nem todos os investidores estão seguros com esse cenário, o que alimenta a volatilidade. A combinação de anúncio das tarifas e ruídos fiscais chegou a derrubar a bolsa americana para as mínimas do ano em abril, seguida de uma recuperação em maio que apagou as perdas.
A retomada, porém, mas não conseguiu tranquilizar completamente o mercado, que debate o fim do chamado excepcionalismo americano, que colocava os ativos americanos em situação de superioridade no mercado global.

Um dos maiores efeitos segue repercutindo sobre o câmbio: o dólar já caiu perto de 10% em 2025 segundo o DYX, índice que mede o desempenho da moeda americana frente a uma cesta de divisas globais fortes.
Santucci disse avaliar que uma eventual perda do protagonismo dos EUA não é uma discussão de curto prazo.
“Atualmente, 90% das transações em termos de moeda são feitas em dólar. As transações do tesouro americano são 15 vezes maiores, em termos de volume, do que os títulos da Alemanha por exemplo”, afirmou.
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“Existe estruturalmente uma discussão [de perda de relevância dos EUA], mas vai levar tempo. Por outro lado, Santucci disse que o cenário estimula a perda do status do dólar como “player quase que exclusivo” entre as divisas globais – condição que a moeda americana havia consolidado depois da crise de 2008.
Quando o assunto é renda variável, o co-head e CIO de portfolio solutions global do BTG Pactual disse enxergar uma busca maior por diversificação entre geografias, mas defendeu que isso também pode ser feito dentro da própria bolsa americana.
“Se você pegar o S&P 500 como uma proxy da bolsa dos EUA, são empresas multinacionais, com companhias listadas que não são americanas. Portanto, de alguma forma, o investidor já tem uma diversificação natural”, disse.
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